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Sertão


Um dia caminhei nele
Eram dias longos e secos
De uma paisagem onde nada se avistava


Tinha Sol, então tinha beleza
Mas dureza de boniteza
Tinha vida resistindo, galhos se contorcendo para rasgar o céu
Eu sabia que tinha que chegar
Mas não sabia onde
Era preciso avançar

Vivi a seca dos sentimentos
A escassez dos quereres
Seguia sobrevivendo

A paisagem sempre tão ríspida não acenava respostas
Mas estavam todas ali
Hoje eu sei

Era tanto vazio, e tanta beleza
Que eu seguia por intuição
Com os pés rachados
A pele sangrando
E a alma perdida

O chão que queimava também estimulava os pés cansados
No sertão, o sofrimento é paisagem
E a seca, realidade. A incerteza o presente. Não há umidade. 

Não existe sutileza
Tudo é terra e fogo. E ar. 

E caminhei tanto tempo que não sabia que existia a chuva e o verde

Tanto tanto
que meus olhos secos
nem notaram a vegetação quando cheguei Lá

Percebi algo diferente
Uma brisa fresca, um  novo tom que agredia meus olhos
E a alma sorriu faceira

Ela sabia

Eram novos tempos

Continuei em frente
E nem via os anjos acenando
Dizendo "seja bem vinda"

Notei meus pés mais limpos
Minhas mãos mais jovens

A surra dos últimos tempos, ficavam para trás pouco a pouco
E enxerguei um broto verde
como um leme, um tapa, um elixir de saúde, eu voltei a acreditar na vida

Eu via a vida

Sem querer, sem esforço
Desde então, a paisagem se tornou vicejante 

Até as flores apareceram sobrepondo-se ao ocre 
E pessoas sem cara de calango passaram por mim e me olharam nos olhos
Eu finalmente era alguém

Eu finalmente me fiz visível

E um dia me permiti abraçar

Mais flores surgiram e com o tempo
Notei que os olhos são a janela da alma
porque vêem aquilo que conseguem ver
Mas tudo, tudo tudo já estava exatamente ali, em frente, ao redor.
Era  o fim do meu sertão espiritual.

Minha alma já não tinha janelas nem paredes 

Meu olhos eram a paisagem 
Uma etapa vencida. Um outro tempo e agora novos sertanejos faziam a travessia e eu deveria pintar um pássaro ou um cactus verde e florido no seu cenário, para que sua alma não se cansasse de atravessar. Como a mim fizeram. 

Sem machucar, como um pai que segura nas mãos do filho que quer se levantar para os primeiros passos. Invisíveis, vendo nossos irmãos sangrarem os pés, sem sentir a dor deles, preparando o jardim das primeiras flores.

Quando o Sertão virar Mar seremos um só Bioma. Ser tão único porque seremos funcionalmente iguais. 

Comentários

Michele disse…
Mana,mana, mana... o que temos que passar ninguém mesmo passa por nós não é? Mas espero que meu amor possa ter ajudado, emanado daqui, a te auxiliar nesse "atravesso". Mas tudo passa minha irmã, e tudo será sempre melhor. Lindo, lindo, lindo!!! te amo!
Unknown disse…
A vida sempre nos guarda surpresas.
O sol sempre nasce para todos, mas precisamos estar lá para vê-lo.
Pra sentir seu calor.
Sentir sua luz.

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