O raso, de tão raso, transbordou em vazio. E o vazio era pouco e tão nada que fez um estardalhaço e quebrou tudo que era tão alto, tão belo e tão frágil... Quando o último caco ainda se movimentava no chão, o chão partiu. Nada era como se enxergava. Ficou o vazio. Do mais fundo poço vazio e escuro, e tênue como o nada cheio de ruídos, brotou um fio de luz. Tão fino que chegava a cegar como a esperança de se entender e se fazer entendido. É confuso? Não, é regra. Não há ser humano que não passará por isso e não há santo que não tenha ultrapassado. Estilhaçar o ego, agradecer o elogio como quem passa por um cão feroz com respeito mas não adula. O ego cega, atordoa, brinca e depois vai embora. Quando você acha que está louco, desvairado, incompreendido, absolutamente SÒ, é sinal que sua parede está ruindo. Se você sobreviver e conseguir potencializar aquele fio de luz, ali sim você começará a existir, de verdade. Sem essas ou aquelas expectativas mórbidas porque o tempo de cada um é o tempo de cada um e faz milhões de pessoas de mesmo idioma não se compreenderem. Depois disso é possível que você passe a viver na time line. Nem à frente, nem para trás de quem quer que seja. Apenas no seu lugar. E não se esqueça. Quando tudo ruir, esse deverá ser o começo. Por isso não se agarre a velhos hábitos e expectativas que no fundo já não calam mais no teu coração. Se jogue no vazio e deixe a vida embalar teu sono, beijar tua face e te batizar com o nome de quem chegou lá. Não importa qual. Você atenderá apenas pelo chamado da paz. Como muitos outros, apenas e tudo isso. Um filho da paz.
Parte de mim é amor e a outra é ilusão. O exercício de viver é alargar as margens da primeira até que a outra simplesmente vire a uma. Tem dias que somos mais a primeira, tem dias que estamos na fronteira. Tem dias que somos pura beira. Não cobro e não ligo, olho pro lado e digo: nem vem, que eu sei voltar pra lá. É uma maré que sobe e desce, movida pelos sentimentos que são movidos pelos pensamentos. Já fui tsunami, já fui lagoa, fá fui até sertão, mas eu sei, é tudo condição. É passageiro. Eu sou passageiro, e também o mar, e também o chão. Ah essa Tao evolução, que cresce dentro da desconstrução. Esse tudo que busca se preencher de nada. Essa divisão que nos insiste, condição de alma triste, de um ego que se alimenta e se maquia de presente. E a união ali latente, aguarda soberana o fundir do último átomo, o ruir da última ilusão. Metade de mim é vida, a outra metade é desconstrução.
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