Até os meus 18 anos meu pai falava em rodízio de carnes e eu,
prontamente me animava. Minha irmã ia, "enchia a cara" de beterraba e sempre
virava chacota por conta disso.
Eu era uma consumidora de carne.
As ceias de natal da minha família sempre foram lotadas de
peru, carne ‘louca’ e leitoa que minha avó, 11 anos depois de eu me tornar
vegetariana ainda insistia em me oferecer.
Um dia minha mãe me levou a um curso de introdução ao
esoterismo. Entre as muitas novidades que eu me deparei, uma das aulas explicava
que todos nós, animais mamíferos temos corpos emocionais, mentais e etérico (espécie de protótipo energético do nosso corpo físico).
Nessa aula, pela primeira vez na vida pensei no animal como
animal e não como comida.
Cheguei em casa e disse à minha mãe: não como mais carne. Ela
rio de cantinho de boca, como quem diz “hã hã”.
Estou vegetariana faz 21 anos. Mas comi carne até os 18 e
acredito em reencarnação. Logo, devo ter comido carne por muitas outras vidas,
por isso não curto sermões. Além de chatos são ineficazes.
Sobre o ocorrido com o Rodrigo Hilbert e a ovelha, não foi a
primeira vez que me espantei. Uma vez, no Terra da Gente tiraram os bagos do
boi e fritaram a iguaria/saco com o boi mutilado no enquadramento da câmara. Não
dava para tirá-lo de cena? Mas era um alimento de tetas, digo, de sacos, não um
boizinho do desenho animado, um animal, um ser que merecesse um pouco de ética.
Acredito que, o programa de ‘culinária’ do Rodrigo Hilbert
trouxe à tona um dos muitos tabus da nossa sociedade: se não vejo não é comigo.
Quando li e vi as fotos pensei no que o teria motivado a
fazer da forma que fez. Ele explicou: era pra valorizar o controle de qualidade
da origem dos alimentos.
Ok. Está explicado. Para o Rodrigo, a ovelha, filhote,
vivendo entre seus pares pacificamente é comida. Ponto. Ela não é um animal,
irmão de evolução como o cachorro que provavelmente ele presentou aos seus
filhos.
A partir daí, tudo fica fácil. Degolar a comida e deixá-la
sangrando de ponta cabeça em rede nacional é como abrir um pacote de confetes e
ver voar aquele mundo de bolinhas coloridas pelo chão.
Tenho certeza que esse programa fez com que muitas pessoas
que, como eu, não haviam sequer parado para pensar no assunto, deixassem de
comer animais. Outras, como o Rodrigo, como minha avó querida que matava e
limpava a leitoa todo santo ano, vão achar super natural e pronto.
Certa vez me apresentaram uma estudante de veterinária que
cuidava de bezerros e assumia que olhava para eles imaginando que bife gostoso se
tornariam em breve.
Comer ou não comer carne. Um ato espiritual, político,
cultural ou tudo isso junto? Assim tem sido a história da humanidade. Tentar
equilibrar os pontos de vista que por vezes vão ser diametralmente opostos.
O que dá para tirar de bom disso tudo é que, independentemente
de ser um ou outro, que a gente, como animais pensantes que somos, nos
coloquemos diante das situações para fazermos as escolhas e não simplesmente fazer
vista grossa como um zumbi existencial que reproduz comentários, mastiga pedra,
carne e cimento e manda pra dentro sem refletir.
Podemos sim ser felizes fazendo escolhas conscientes. E,
infelizmente, a história mostra que não é isso que nos incentivam a fazer. Engolimos
muito mais do que a carne sem refletir a respeito. “Comemos” estereótipos,
notícias, moda, modelos de família, plantas de casa, peso ideal, e tanta coisa
sem sequer dar uma mastigada consciente.
Comentários
Cultura de subsistência é uma coisa, e mostrar isso já gerou revolta. Imagina quando mostrarem como fazem os grandes "produtores" de carnes?
Um beijo.