“Olha Faculdade um real, faculdade um real!” É só o que está faltando. Em cada esquina, cada dia uma Universidade se forma na região. É um filão ou um filé de mercado? Dia a dia elas surgem vendendo sonhos e perspectivas nesse mundo movido a ilusões.
Espero que essas novas venham trazer alguma renovação no trato ao aluno. Alguma política humana, mais justa. Isso por que eu não cheguei a pegar uma dessas inovações. Fui filha daquela velha aqui de Campinas. Tradicional e sem fins lucrativos. De todas que abriram e virão a nascer, a mais filãotrópica de todas. O pior, é que mesmo sabendo que o terreno não é mais só dela, insiste em manter-se antiquada e não entende que aquelas figuras que transitam por lá com tipos, caras e estilos diferentes, são gente.
Completei meu curso de jornalismo em dezembro do ano passado. Foram quatro anos. Suados quatro anos! Digo suados, pois com exceção do primeiro ano quando tive ajuda do meu pai no pagamento do curso, daí pra frente, era ganhar pra bancar esse sonho. Em 2002 passei o ano todo vivendo com a ajuda de custo que representa o vale refeição e o alimentação. O salário mesmo batia na conta e pulava logo pra conta da escola. Pagava com prazer. Tinha onde morar, o que comer e ainda pagava o curso que sem sombra de dúvidas me acrescentou muito. Cinemas e festas, nem pensar, a grana não dava.
Minha relação de amor e ódio com a tal escola começa aqui, em setembro de 2002.
Por uma série de efeitos colaterais eu deixei de tomar a pílula. Era noiva há três anos e avisei sobre minha decisão. Numa bela tarde de sábado, fazendo o que a humanidade faz desde que passou a existir, meu então companheiro e eu não tivemos a reação necessária que o momento pedia e eu intuitivamente soube: nove meses depois chegaria o bebê lindo que hoje já anda, resmunga, brinca e mexe no mouse neste momento.
Final do 3º ano, hora de renegociar a dívida para a matrícula do 4º e último ano. Converso, faço contas e no final das contas quem manda é a filãotrópica.
No desespero por concluir o curso, sabendo que se não o fizesse não o faria depois por tudo que me esperava a partir de então, aceitei pagar exatamente aquilo que ganhava por mês.
Deu certo por um, dois meses, mas a vinda de um bebê, mesmo com ajuda de todos ao redor, pede algum investimento por questões óbvias.
Fui até o famigerado setor de Contas a pagar, o oficial tirador de sono de boa parte dos freqüentadores da instituição. Marquei com uma assistente social como de praxe, já com o bebê nos braços, diga-se de passagem, não para fazer pressão psicológica, mas por que naquela faze eu era sua única fonte de alimentação.
Fui decidida a fazer uma proposta para renegociação. Sugeri o pagamento de metade do valor mensal, com aplicação de juros de forma que eu financiaria o valor total num número maior de parcelas. Não sei o que as pessoas estudam no curso para ser Assistente Social, mas com certeza, talvez pela própria limitação do local qualquer um com o mínimo de treinamento conseguiria responder: “Nós não dividimos em mais vezes”.
“Dividimos!” pasme... Esse foi o termo que a profissional usou. Achei por um momento que estava nas Casas Bahia comprando uma geladeira talvez. Na verdade, se lá estivesse tenho certeza de que negociariam. O que estraga é essa falta de visão mercadológica misturada com uma vontade de parecer sem fins lucrativos. Avisem lá que não estamos a comprar eletrodomésticos. São nossos sonhos, são os futuros profissionais desse país doente e assim somos tratados por querer estudar. O pior é que ela nem viu que eu estava pagando a mais de um ano corretamente. As festas que eu não fui, os idomas que eu não aprendi, as viagens que eu não fiz, o carro que eu não comprei, nada disso foi analisado, apenas ela conseguia me dizer que eles não dividiam em mais vezes! Ainda bem que não estudei pra isso. Deve ser horrível...
A questão é que pobre e classe média tem que barganhar tudo, inclusive o nome. Se quiser ascender culturalmente tem que dar algo em troca, mesmo que seja o próprio nome. Em vinte sete anos nunca tive o nome protestado. Sempre honrei meus compromissos custasse o que custasse, mas para concluir o curso, que sinceramente pagaria com todo prazer, só pelas aulas que tive com aquele time de peso da faculdade de jornalismo, terei que deixar meu nome no penhor. Terei meu nome protestado porque parece que não se pode ter tudo.
Estou chateada sim, fica um sentimento de impotência terrível, um amargo, pois não sou assim e sei que isso implica em uma série de transtornos na vida material e profissional.
Fica aqui apenas um desabafo de mais uma de tantos que vivenciam e vivenciarão isso. Para a digna escola, sugiro apenas que troque o nome, troque o título, pois se diz cristã e sem fins lucrativos, quando na verdade, está muito longe de seguir os passos de Cristo, chegando a ser a antítese da sua obra.
Fazer meia dúzia de boas ações junto à sociedade pra mostrar num jornal vitrine e angariar alunos quando, por trás dos bastidores agem mercadologicamente e ainda sem uma boa estratégia de mercado, é horrível. Mudem as regras, adaptem-se à instabilidade do mercado. Eu tive um filho, mas quantos não perdem o emprego ou tem queda de salário. Mudem, façam uma reforma, adaptem-se à modernidade, mesmo porque cada vez mais deixam de ser os únicos no filão. Pelo menos deixe de vestir a máscara de filantrópicas e passem a assumir os objetivos que têm de forma clara e verdadeira.
Alexandra Langoni, Valinhos, agosto de 2004
Espero que essas novas venham trazer alguma renovação no trato ao aluno. Alguma política humana, mais justa. Isso por que eu não cheguei a pegar uma dessas inovações. Fui filha daquela velha aqui de Campinas. Tradicional e sem fins lucrativos. De todas que abriram e virão a nascer, a mais filãotrópica de todas. O pior, é que mesmo sabendo que o terreno não é mais só dela, insiste em manter-se antiquada e não entende que aquelas figuras que transitam por lá com tipos, caras e estilos diferentes, são gente.
Completei meu curso de jornalismo em dezembro do ano passado. Foram quatro anos. Suados quatro anos! Digo suados, pois com exceção do primeiro ano quando tive ajuda do meu pai no pagamento do curso, daí pra frente, era ganhar pra bancar esse sonho. Em 2002 passei o ano todo vivendo com a ajuda de custo que representa o vale refeição e o alimentação. O salário mesmo batia na conta e pulava logo pra conta da escola. Pagava com prazer. Tinha onde morar, o que comer e ainda pagava o curso que sem sombra de dúvidas me acrescentou muito. Cinemas e festas, nem pensar, a grana não dava.
Minha relação de amor e ódio com a tal escola começa aqui, em setembro de 2002.
Por uma série de efeitos colaterais eu deixei de tomar a pílula. Era noiva há três anos e avisei sobre minha decisão. Numa bela tarde de sábado, fazendo o que a humanidade faz desde que passou a existir, meu então companheiro e eu não tivemos a reação necessária que o momento pedia e eu intuitivamente soube: nove meses depois chegaria o bebê lindo que hoje já anda, resmunga, brinca e mexe no mouse neste momento.
Final do 3º ano, hora de renegociar a dívida para a matrícula do 4º e último ano. Converso, faço contas e no final das contas quem manda é a filãotrópica.
No desespero por concluir o curso, sabendo que se não o fizesse não o faria depois por tudo que me esperava a partir de então, aceitei pagar exatamente aquilo que ganhava por mês.
Deu certo por um, dois meses, mas a vinda de um bebê, mesmo com ajuda de todos ao redor, pede algum investimento por questões óbvias.
Fui até o famigerado setor de Contas a pagar, o oficial tirador de sono de boa parte dos freqüentadores da instituição. Marquei com uma assistente social como de praxe, já com o bebê nos braços, diga-se de passagem, não para fazer pressão psicológica, mas por que naquela faze eu era sua única fonte de alimentação.
Fui decidida a fazer uma proposta para renegociação. Sugeri o pagamento de metade do valor mensal, com aplicação de juros de forma que eu financiaria o valor total num número maior de parcelas. Não sei o que as pessoas estudam no curso para ser Assistente Social, mas com certeza, talvez pela própria limitação do local qualquer um com o mínimo de treinamento conseguiria responder: “Nós não dividimos em mais vezes”.
“Dividimos!” pasme... Esse foi o termo que a profissional usou. Achei por um momento que estava nas Casas Bahia comprando uma geladeira talvez. Na verdade, se lá estivesse tenho certeza de que negociariam. O que estraga é essa falta de visão mercadológica misturada com uma vontade de parecer sem fins lucrativos. Avisem lá que não estamos a comprar eletrodomésticos. São nossos sonhos, são os futuros profissionais desse país doente e assim somos tratados por querer estudar. O pior é que ela nem viu que eu estava pagando a mais de um ano corretamente. As festas que eu não fui, os idomas que eu não aprendi, as viagens que eu não fiz, o carro que eu não comprei, nada disso foi analisado, apenas ela conseguia me dizer que eles não dividiam em mais vezes! Ainda bem que não estudei pra isso. Deve ser horrível...
A questão é que pobre e classe média tem que barganhar tudo, inclusive o nome. Se quiser ascender culturalmente tem que dar algo em troca, mesmo que seja o próprio nome. Em vinte sete anos nunca tive o nome protestado. Sempre honrei meus compromissos custasse o que custasse, mas para concluir o curso, que sinceramente pagaria com todo prazer, só pelas aulas que tive com aquele time de peso da faculdade de jornalismo, terei que deixar meu nome no penhor. Terei meu nome protestado porque parece que não se pode ter tudo.
Estou chateada sim, fica um sentimento de impotência terrível, um amargo, pois não sou assim e sei que isso implica em uma série de transtornos na vida material e profissional.
Fica aqui apenas um desabafo de mais uma de tantos que vivenciam e vivenciarão isso. Para a digna escola, sugiro apenas que troque o nome, troque o título, pois se diz cristã e sem fins lucrativos, quando na verdade, está muito longe de seguir os passos de Cristo, chegando a ser a antítese da sua obra.
Fazer meia dúzia de boas ações junto à sociedade pra mostrar num jornal vitrine e angariar alunos quando, por trás dos bastidores agem mercadologicamente e ainda sem uma boa estratégia de mercado, é horrível. Mudem as regras, adaptem-se à instabilidade do mercado. Eu tive um filho, mas quantos não perdem o emprego ou tem queda de salário. Mudem, façam uma reforma, adaptem-se à modernidade, mesmo porque cada vez mais deixam de ser os únicos no filão. Pelo menos deixe de vestir a máscara de filantrópicas e passem a assumir os objetivos que têm de forma clara e verdadeira.
Alexandra Langoni, Valinhos, agosto de 2004
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